Em julho de 2025, um estudo internacional liderado pelo Instituto Max Planck de Neurociência Cognitiva (Países Baixos) trouxe novas respostas sobre a dislexia — um dos transtornos de aprendizagem mais recorrentes nas salas de aula e consultórios psicopedagógicos.
A pesquisa analisou dados genéticos e neuroanatômicos de milhares de participantes, combinando imagens de ressonância magnética cerebral com informações genéticas. O objetivo? Entender como a predisposição genética para dislexia influencia o cérebro antes mesmo da alfabetização.
Os resultados mostram que a dislexia não é apenas um problema “pedagógico”, mas envolve alterações estruturais reais e detectáveis no cérebro, influenciadas por herança genética.
O que o estudo descobriu?
Os cientistas identificaram que pessoas com maior risco genético para dislexia apresentavam:
- Volumes menores em regiões cerebrais relacionadas ao processamento da linguagem falada e à coordenação motora da fala;
- Volumes maiores em áreas do córtex visual, possivelmente como forma de compensação neurológica;
- Alterações específicas na substância branca cerebral, principalmente na cápsula interna, associada à comunicação entre diferentes áreas cerebrais.
Essas mudanças não são causadas pela dificuldade de ler — elas antecedem o aprendizado da leitura, o que indica que a dislexia já está presente na estrutura cerebral desde cedo, e não é resultado do fracasso escolar.
Por que isso é tão importante?
Essa descoberta reforça que a dislexia:
- É uma condição neurobiológica real, com fundamentos estruturais no cérebro;
- Pode ser detectada antes dos sinais escolares tradicionais aparecerem (como troca de letras ou lentidão para ler);
- Pode ter base genética observável, o que abre caminhos para diagnósticos e intervenções mais precoces.
A grande promessa dessa linha de pesquisa é o desenvolvimento, no futuro, de ferramentas de rastreio precoce baseadas em genética e neuroimagem — permitindo que educadores e psicopedagogos intervenham antes mesmo que a criança sinta os impactos emocionais do fracasso escolar.
O que isso muda na atuação do psicopedagogo?
Embora o uso clínico da genética e da neuroimagem ainda não seja rotina no Brasil, esse tipo de evidência tem grande valor para orientar práticas mais eficazes e conscientes, como:
- Refinar os critérios de avaliação psicopedagógica, indo além da performance escolar e considerando histórico familiar, atrasos de fala e sinais precoces de processamento fonológico;
- Reduzir a culpabilização da criança ou da família, mostrando que a dificuldade de leitura não é falta de esforço ou desatenção, mas uma diferença no funcionamento cerebral;
- Aumentar a vigilância preventiva na educação infantil, priorizando triagens, estimulação da consciência fonológica e atividades multissensoriais de alfabetização;
- Apoiar o uso de metodologias específicas, como fônicas e estruturadas, já que crianças com dislexia se beneficiam mais de estratégias consistentes, repetitivas e visuais.
Uma oportunidade de mudar histórias
Quantas crianças enfrentam rótulos, baixa autoestima e atrasos escolares porque ninguém identificou sua dislexia a tempo?
Esse estudo reafirma o que muitos psicopedagogos defendem há anos: quanto mais cedo compreendermos o funcionamento singular de cada cérebro, mais cedo podemos oferecer caminhos de aprendizagem possíveis, respeitosos e eficazes.
Conclusão: Diagnóstico precoce começa com conhecimento profundo
O avanço das neurociências permite que deixemos para trás ideias ultrapassadas sobre a dislexia e abracemos uma compreensão mais precisa e empática.
Para os psicopedagogos e neuropsicopedagogos, esse é mais um passo rumo a uma atuação pautada na ciência, na escuta ativa e na intervenção que transforma — sem rótulos, sem culpa, e com muito mais possibilidade de sucesso.
Referência de apoio
Estudo completo (em inglês): Nature Neuroscience – July 2025
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